Um Conto de Natal
...ou talvez não!

Naquele dia, na escola, viviam-se momentos de grande algazarra e alvoroço. Era a festa de Natal! Todos riam, repartindo alegremente as tarefas e adereços ou dando algum retoque final no cenário.

Todos? Não! O Joãozinho mantinha-se à margem, sem alento para participar em tamanha tarefa.

Na véspera, a sua irmãzinha Belita estivera quase toda a noite a chorar a plenos pulmões dos seus tenros oito mesitos. Sim, toda a noite! E ninguém dormira naquela casa. Afinal, não era a primeira, nem a segunda, nem a terceira vez que isso acontecia; era até muito frequente nos últimos tempos. A preocupação espelhada no semblante de seus pais, não deixava margem para dúvidas: Belita estava doente, mesmo muito doente!

Joãozinho não queria aquela festa. Adorava a irmã e lembrava-se muito bem de como se sentira naquele dia. A sua mãe deitada numa cama da maternidade, segurava entre os braços uma menina tão bela como nunca havia visto até então. Pequenina e frágil, de olhos azuis e cabelos de ouro, ali estava ela a olhar para ele como se o visse realmente, como se soubesse quem ele era. Uma luz suave, um leve brilho irradiava do seu rosto pequenino, e Joãozinho, logo ali, naquele preciso momento, soube que nunca, mas mesmo nunca mais, seria o mesmo. Já adorava aquele pequeno ser; era a sua irmã, e ele seria o seu guardião, o seu protetor, o seu confidente e amigo…
- Joãozinho é a tua vez- segredou a professora- vai, faz o teu melhor, está toda a gente à espera!

Joãozinho pegou na sua flauta e, num gesto não ensaiado, ajoelhou-se junto do Menino ali deitado nas palhinhas. Uma lágrima rolou silenciosa e quente pelo seu rosto…

Era habitual acompanhar os pais à missa do galo. O presépio, pela sua grandiosidade e cuidado nos pormenores, deixava-o sempre extasiado. Era, sem dúvida, um polo de atração para todos quantos visitavam a sua terra. Contudo, para ele, todas aquelas figurinhas não passavam de imagens sem grande significado, um tanto irreais e distantes.

Naquele momento, porém, ali ajoelhado junto do Menino, sentiu-se estranhamente sereno… o que seria aquela luz tão doce que cada vez mais o envolvia? Pegou na flauta e tocou. Tímido no início, o som foi crescendo de intensidade e encantamento, invadindo tudo e todos. Tocou como jamais alguém o ouvira tocar. Pensou na sua irmãzinha e agradeceu ali, junto do Menino, tudo o que ela trouxera à sua vida. Estava agradecido por Tudo!

Sentia agora uma plenitude tão grande! Não precisaria de se preocupar mais, tinha a certeza.

Toda a sala aplaudiu de pé!

Obrigada, Joãozinho! As coisas boas estão sempre à nossa disposição; apenas temos que as sentir, agradecer e partilhar.

Feliz Natal!

Ana Luísa Tinoco